MATOS, Lúcia Almeida — untitled, in Catalogue of 12.º Prémio Amadeo de Souza-Cardoso, Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso, Amarante, 2020, pp. 26-27.
Sorry, text only available in portuguese.
other texts
A produção artística de Isabel Carvalho pode
caracterizar-se como envolvendo, consistentemente, uma articulação entre a
escrita e a imagem ou o objeto, suportada por uma componente investigativa que
cada novo projeto suscita. Identificam-se na sua trajetória algumas constantes
que reconhecemos presentes em projetos que, à primeira vista, poderão parecer muito
diversos. Essas constantes, que emergem da aparente diversidade de tipologias
de obra e de variedade de linguagens e técnicas, resultam de uma postura que
poderá ser descrita como de uma certa serenidade combativa. De facto, os meios
simples, modestos até, que Isabel Carvalho utiliza livremente sem seguir usos
convencionais nem aderir a hierarquias de materiais ou linguagens artísticas desafiam,
(pre)conceitos estabelecidos do que é ou pode ser um intervenção artística e
constituem, por si só, uma forma
de ação política; acrescente-se a leitura e a escrita – atividades que têm
lugar em ambiente tranquilamente privado e que, quando trazidas a público,
podem tornar-se em instrumentos de combate pessoal, social e político; apresentem-se
estes elementos de forma não convencional ou em espaços inesperados, e o
resultado será, no caso da obra de Isabel Carvalho, algo poético, encantatório
por vezes, mas sempre questionador e interventivo.
Em resposta ao convite para participar na presente edição do Prémio Amadeo de Souza-Cardoso, em que Eduardo Batarda é o artista consagrado, entendeu Isabel Carvalho, após revisitar o Museu, produzir obra nova, para o lugar e a pensar no artista que lhe dá o nome. Interessou-lhe um aspeto menos estudado da produção de Amadeo, a caricatura e portanto o humor, presente também no trabalho de Eduardo Batarda. Contudo, o trabalho de Isabel Carvalho não comenta as caricaturas de Amadeo. Como a própria explica, trabalha o aspeto que identifica em caricaturas de Amadeo mas que se afasta da tradição mais forte, na época, da caricatura política “enquanto denúncia do poder e dos seus representantes”, para explorar a caricatura que emerge “das relações humanas nomeadamente, de amizade” entendendo-as como políticas a um nível mais radical por realçarem a “individualidade subjetiva do outro”. Isabel Carvalho considera que Amadeo foi “sensível ao que de irredutível o seu semelhante lhe apresentava ao olhar”, afastando-se da construção de tipos de personagens de que a caricatura ficou refém”.
Invocando a caricatura através de vários elementos expostos num local improvável de interceções e passagem de visitantes – pequenos artefactos em gesso pintado, executados a partir de desenhos, fisionomias e movimentos registados com marcadores sobre tecido e um cartaz com texto pessoal sobre a caricatura, Isabel Carvalho apresenta a sua Histoire da la Caricature – em francês por se referir ao país e à cultura em que Amadeo encontrou e explorou a sua própria modernidade. Na sua “história da caricatura”, Isabel Carvalho identifica o que considera central, único e essencial nessa prática artística familiar mas distinta do retrato e interpela-nos: “Volta os teus olhos para um rosto qualquer, ensaia fazer dele uma imagem significativa e, suavizando a tua dúvida, retira a realidade da idealização. Clarifica com empenho, sobrecarregando ora aqui ora ali, tanto quanto necessário, a cumplicidade dos seres entre si como a singularidade que lhes é própria. Isso é verdadeiramente belo, não pensas assim?"
Em resposta ao convite para participar na presente edição do Prémio Amadeo de Souza-Cardoso, em que Eduardo Batarda é o artista consagrado, entendeu Isabel Carvalho, após revisitar o Museu, produzir obra nova, para o lugar e a pensar no artista que lhe dá o nome. Interessou-lhe um aspeto menos estudado da produção de Amadeo, a caricatura e portanto o humor, presente também no trabalho de Eduardo Batarda. Contudo, o trabalho de Isabel Carvalho não comenta as caricaturas de Amadeo. Como a própria explica, trabalha o aspeto que identifica em caricaturas de Amadeo mas que se afasta da tradição mais forte, na época, da caricatura política “enquanto denúncia do poder e dos seus representantes”, para explorar a caricatura que emerge “das relações humanas nomeadamente, de amizade” entendendo-as como políticas a um nível mais radical por realçarem a “individualidade subjetiva do outro”. Isabel Carvalho considera que Amadeo foi “sensível ao que de irredutível o seu semelhante lhe apresentava ao olhar”, afastando-se da construção de tipos de personagens de que a caricatura ficou refém”.
Invocando a caricatura através de vários elementos expostos num local improvável de interceções e passagem de visitantes – pequenos artefactos em gesso pintado, executados a partir de desenhos, fisionomias e movimentos registados com marcadores sobre tecido e um cartaz com texto pessoal sobre a caricatura, Isabel Carvalho apresenta a sua Histoire da la Caricature – em francês por se referir ao país e à cultura em que Amadeo encontrou e explorou a sua própria modernidade. Na sua “história da caricatura”, Isabel Carvalho identifica o que considera central, único e essencial nessa prática artística familiar mas distinta do retrato e interpela-nos: “Volta os teus olhos para um rosto qualquer, ensaia fazer dele uma imagem significativa e, suavizando a tua dúvida, retira a realidade da idealização. Clarifica com empenho, sobrecarregando ora aqui ora ali, tanto quanto necessário, a cumplicidade dos seres entre si como a singularidade que lhes é própria. Isso é verdadeiramente belo, não pensas assim?"